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"Aguardar por uma vacina da covid para a volta às aulas é um enorme equívoco", diz especialista da SBP

Retorno das aulas presenciais é debatido em live ‘Vacinas e Escola - O que esperar para 2021?’ com médicos da Sociedade Brasileira de Pediatria e professora da FGV

A pandemia virou a rotina das famílias de cabeça para baixo e deixou muitas dúvidas quanto ao que vem pela frente. Em uma transmissão ao vivo realizada nesta sexta-feira (27) nas redes sociais da Crescer, com o apoio da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) e como parte da campanha "Informar, Amamentar, Imunizar", a professora universitária Claudia Costin, fundadora e diretora do Centro de Excelência e Inovação em Políticas Educacionais da Fundação Getúlio Vargas (FGV) e os pediatras infectologistas Renato Kfouri, presidente do Departamento de Imunizações da SBP e Marco Aurélio Sáfadi, pediatra infectologista e professor da faculdade de medicina da Santa Casa debateram algumas dessas questões que tem causado insegurança entre filhos e pais.

O retorno às aulas presenciais em 2021 e a queda na cobertura vacinal da população brasileira durante a pandemia foram alguns dos principais focos da discussão, mediada por Ana Paula Pontes, editora-chefe da Crescer. Durante a transmissão, o público também pode participar enviando perguntas aos especialistas em tempo real.

No total, o bate-papo durou cerca de 1h30 e você confere a seguir as principais dúvidas respondidas pelos participantes durante a transmissão ao vivo:

Nos próximos anos, veremos um aumento de casos de diversas doenças devido à queda da cobertura vacinal?

Renato Kfouri: Antes da Covid-19, a procura pelas vacinas entre a população já estava em queda. O principal fator que levou a esse cenário foi a percepção de risco da sociedade ter diminuído em relação a diversas doenças, como o sarampo. O próprio sucesso das vacinas faz com que as pessoas não se sentissem ameaçadas por essas doenças, que eram flagelos no passado, quando as família conviviam diretamente com elas.

Atualmente, o receio de sair de casa para vacinar as crianças intensificou esse problema. Esse temor é equivocado já que as crianças, no geral, tem poucas complicações relacionadas à Covid-19, enquanto a poliomielite, por exemplo, pode deixar sequelas para uma vida inteira em muitos dos pequenos atingidos. Vacinar é serviço essencial e não há razão para atrasar o calendário de vacinação mesmo na pandemia.

O que nós sabemos hoje da vacina contra covid-19 para crianças?

Renato Kfouri: As vacinas contra covid-19 serão destinadas aos grupos mais vulneráveis, como os idosos e portadores de doenças crônicas, então as crianças não serão, no primeiro momento, o público alvo dessas campanhas de vacinação. Provavelmente haverá vacinas em breve, mas aguardar por elas para a volta as aulas é um enorme equívoco, pois haverá prejuízo muito significativo para a saúde física e mental dos pequenos caso tenham que ficar mais um ou dois anos fora da escola.

Existe risco de tomar vacina caso a criança esteja com covid-19 sem que os pais saibam?

Marco Aurélio Sáfadi: Situações como um resfriado não contraindicam a vacinação. Agora, se houver febre ou comprometimento do estado de saúde geral da criança é razoável que aguarde o caso se estabilizar para aplicar a vacina.

Se a criança está clinicamente bem, sem sintomas, independentemente de ter ou não contraído um vírus, a vacinação pode ser dada e não existe risco adicional. Lembrando que a Covid-19 tem impacto desproporcional entre a população mais idosa e, no cenário pediátrico, na maioria da vezes, se manifesta através de sintomas leves.

A escola é um local de risco para transmissão de covid?

Marco Aurélio Sáfadi: Esse é um ponto que tem sido exaustivamente investigado desde os primeiros casos, na tentativa de entender o papel das crianças na transmissão dessa doença. Para muitas doenças respiratórias, como a bronquiolite, as crianças são importantes vetores de transmissão, mas isso não ocorre, de acordo com os estudos atuais, com a covid-19.

Não quero dizer com isso que as crianças não transmitem a doença, elas podem sim transmitir a Covid-19 como qualquer outro indivíduo, porém as evidências mostram que elas não tem papel preponderante na cadeia de transmissão. Os dados apontam que é muito mais provável que a transmissão ocorra entre membros de um domicilio do que no ambiente escolar.

Um estudo da transmissão da Covid-19 comparando dados da Suécia, que manteve as escolas abertas, e da Finlândia, que fechou as instituições de ensino, mostrou que a taxa de contaminação entre as crianças foi idêntica nos dois países, indicando que a abertura das escolas não representou um aumento de risco de transmissão para as comunidades.

Como a ausência das aulas presenciais pode impactar a vida das crianças?

Claudia Costin: Vivemos uma situação trágica do ponto de vista educacional. A pandemia resultou não só em uma crise sanitária e econômica, mas em uma crise educacional. Muitos professores foram para linha de frente e tentaram assegurar alguma forma de aprendizagem e foi um belíssimo esforço. No entanto, já sabíamos que o Brasil vivia uma crise educacional antes da Covid-19, refletida inclusive no PISA, um teste internacional que avalia alunos de escolas particulares e públicas. Temos ainda uma desigualdade educacional gritante, o segundo país mais desigual nesse aspecto, de acordo com o PISA.

Durante nove meses de pandemia, alguns alunos tiveram acesso a livros e internet enquanto outros vivem amontoados em um cômodo inadequado para estudo. A partir desse cenário, é possível ter uma ideia do desastre que teremos. Não podemos perder o sentido de urgência em relação ao que está acontecendo com a educação.

Além disso, o fechamento das escolas provoca aumento da ansiedade e depressão, expõe as crianças a violência doméstica e causa um retrocesso na presença da mulher no mercado de trabalho, já que muitas ainda são as principais responsáveis pelos cuidados com as crianças e não tem uma rede de apoio.

O que os pais podem esperar de um possível retorno das crianças à escola no ano que vem?

Claudia Costin: O retorno tem que ser acompanhado por protocolos sanitários e pedagógicos e é importante que os pais não fiquem ansiosos com a perda de aprendizagem. Essas crianças vivenciaram algo histórico, é muito importante conversar com elas sobre o que viveram porque não é uma situação típica da infância. Não podemos fingir que nada aconteceu.

Apesar das perdas, que não foram pequenas, é importante valorizar a adaptabilidade que as crianças e famílias demonstraram nesse período. Muitas crianças aprimoraram sua autonomia e senso de responsabilidade nesse período, avanços que merecem ser celebrados.

Link da matéria: https://revistacrescer.globo.com/Educacao-Comportamento/noticia/2020/11/aguardar-por-uma-vacina-da-covid-para-volta-aulas-e-um-enorme-equivoco-diz-especialista-da-sbp.html

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